terça-feira, 24 de abril de 2018

Dos Mistérios XI






Dos Mistérios da Atuação de Deus:

O Amparo de Troia


por um convocado


De fraqueza, Péricles havia caído de joelhos sob a poderosa pressão da luz. Ele tremia, estava branco e gelado. A força do anjo anunciador havia sido demais para ele.
Mas mesmo assim uma pergunta soou de sua boca:
“Mas como devemos encontrar a luz, senhor?”
“Tu a verás na hora de sua chegada. Uma pomba branca irá pairar sobre a casa!”
O hálito do luminoso tocou-o e ele desapareceu no nada diante de seus olhos.
E houve grande movimento no mundo. Péricles o percebia. Seus delicados órgãos de observação se aguçaram ainda mais. Ele, que sempre estivera estreitamente ligado à natureza, sentia o vivificar das plantas e dos animais. Era como se todos os seres se espreguiçassem, se aprumassem e se esforçassem para o alto, no novo brilho. O sussurar nos ares se intensificou, o murmúrio nos rios e nas fontes aumentou de forma extraordinaria.
Como uma clara e delicada via láctea, formou-se um brilho no céu, até embaixo na  Terra.
De modo bem especial, misterioso, sim, respeitoso, esta corrente de luz tocou a sua alma.
Ele falava livremente disso aos seus companheiros, mas estes olhavam para o céu e não conseguia reconhecer nada. Contudo, eles diziam confiantes:
“Deve ser assim, se é Péricles quem diz.”
Ele se preparou para a vinda da grande luz sobre a Terra.
Os pastores acreditaram nele, mas não refletiam a respeito. Eles também não sentiam aquela grande alegria que só é dada ao espírito que se encontra desperto e preparado para o amor de Deus. Eles aguardavam para ver o que aconteceria.  Uma raposa que atacasse a manada, ou uma ovelha doente poderia chamar muito mais a sua atenção.
Péricles sentiu isso. Ele não estava surpreso por causa disso e se calou. Mas quanto mais silenciava, tanto mais intensamente ele sentia todas as elevadas forças do Além que se aproximavam dele.
Ele olhou para baixo, para a cidade adormecida, que se encontrava numa delicada neblina noturna. Archotes em chama tremulavam em algumas casas e portões  os precursores da noite. No leste o azul profundo já havia dado lugar a uma escuridão sem cor; no oeste, porém, ainda estava claro no céu e uma listra vermelha emoldurava o mar.
Todos os enteais haviam desaparecido. Contudo, para ele era como se reluzisse um brilho, uma luz dele mesmo, como de uma lâmpada. Ele olhou em volta, pois achava que um dos seus companheiros havia se aproximado com uma luz. Mas não era isso. Ele reuniu seus pensamentos e lançou-se ao chão, pois seu coração estava transbordante  e orou. Esta solução silenciosa lhe fez bem; tornou-se-lhe claro, que ele estava esperando por algo, por alguma coisa grandiosa, que o arrebataria no espírito de forma poderosa. Ele se lembrou novamente do mensageiro de Deus.
Como ele havia dito? “Eu sou o mensageiro de Deus!” Mas de qual Deus ele havia falado? Quando ele se encontrava sentado assim tão quieto e pensativo, desprendido e cheio de confiança, cheio de humildade, uma voz perpassou-o de forma nítida e clara:
“Só existe um Deus! Nós todos O servimos, somos apenas efeitos de Sua vontade.”
Era assim que soava do alto, dos ares.
“Nós tecemos na Sua lei, mas a luz que agora vem a ti, esta provém Dele”.
Ele sentiu vertigens, pois tudo isso lhe era tão novo.
 O céu naturalmente se envolvera com a noite; as estrelas brilhavam como nas noites úmidas pela chuva, quando um vento quente soprava, limpando o céu. Havia um suave pesadume sobre a terra que exalava um cheiro úmido.
Então foi como se uma corrente de chamas luminosas descesse do céu! Em apenas um segundo, a região inteira estava mergulhada na luz branca. Péricles quis fechar os olhos, mas eles permaneceram arregalados como que obrigados.
E ele viu uma Pomba branca e brilhante acima de si, ela trazia uma rosa dourada no bico. Seu vôo era um deslizar silencioso. Ela desceu sobre o castelo de Príamos e desapareceu.
O pastor se levantou, deixou o seu rebanho e apressou-se para a cidade, para contar o fato ao rei.
Um júbilo soava em sua alma como o badalar de sinos:
“Existe somente um Deus, mas a luz, que agora vem até ti, esta vem Dele!”

(continua)

Editora Der Ruf“ G.m.b.H. Munique – 1934