segunda-feira, 27 de agosto de 2018

África XXII





Nas Florestas da África

Episódio XXII

Uma Nova Invasão

por Charlotte von Troeltsch

Sinopse de Fatos Transcorridos: Bu-anan, também chamada de “mãe branca” por suas anunciações sobre a vinda do filho de Anu inspirou incontida devoção espiritual na tribo, ocasionando atitudes de fé entre todos, exageradas, inconcebíveis, a ponto de provocar descuido pela segurança local...

(continuação)

“Os animais pressentem algo de ruim!” exclamou ele. “Será que inimigos atravessaram nossa vala?”
Aí soou também vozes femininas.
“Venham, homens, o inimigo está ali!”
“Para a vala!” gritou Ur-an e pegou sua faca do chão.
Contudo, era apenas sua faca de comer e trabalhar, mas era melhor do que nada. Também os outros não tinham nenhuma arma consigo, mas todos se lançaram na direção de onde vinham os gritos.
E então eles viram:
Homens invadiam a colônia! Homens que eram totalmente diferentes deles e de seus vizinhos. Eles penetraram pela passagem mais larga, pegaram as mulheres e as moças e olhavam para as baixas cabanas. Era mais curiosidade que os impelia do que desejo de conquista.
Ur-an, porém, via apenas os inimigos e se precipitava com os seus sobre eles.
Agora os intrusos se posicionaram para defesa. Mas antes que começasse a luta corporal, soou três vezes o claro e ecoante grito de coruja. Os Tuimahs abaixaram as facas levantadas e correram para a cabana de Bu-anan.
Os estranhos, admirados pelo resultado do grito de coruja, queriam lançar-se atrás deles, mas uma palavra de seu chefe manteve-os parado. Agora eles rodeavam-no.
Ele era um grande e imponente homem com o semblante claro, sobre o qual pareciam alternar-se sol e tempestade. Sua roupa, em contraste com a roupa dos Tuimahs, era extraordinariamente suntuosa. Seda colorida envolvia estreitamente os membros, mas de tal forma que não impedia nenhum movimento do elástico corpo. Sobre essa roupa pendia uma pele especialmente bela de tigre.
“Permanecei calmos aqui, até que eu vos chame!” disse ele para sua tropa. Era uma grande tropa de guerreiros, aparentemente bem treinados, com muitas e boas armas.

Enquanto eles se colocavam em grupo e esperavam calmamente, ele foi com poucos e longos passos até onde os desarmados Tuimahs se comprimiam em frente a cabana de Bu-anan e de pé escutavam Assustada pelos gritos e pelo alvoroço ela se esgueirara para fora de sua cabana e reconhecera imediatamente que aquilo que lhe fora revelado no dia anterior já acontecia: inimigos invadiram o domínio dos Tuimahs. suas palavras.
Agora ela precisava falar, pois não deveria haver derramamento de sangue! Quando eles ouviram seu chamado de coruja e haviam corrido até lá, ela lhes falou de forma alta e clara, mesmo sua figura estando oscilando de emoção:
“Ouvi a ordem de Anu, povo: Quando homens invadirem vosso domínio, homens chefiados por um grande homem com pele de tigre, então não vos lançai para a defesa! É da Vontade de Anu que vós o seguis. Se não fosse assim então ele vos poderia proteger, assim como fizera outrora quando os espiões haviam invadido.”
Ela parou, o falar tornou-se-lhe difícil. Como ela havia lutado por força, desde ontem, para compreender o incompreensível. Eles deveriam abandonar a aldeia? Eles deveriam ir como prisioneiros? Era esta a Vontade de Anu? No que eles haviam falhado, para que Ele os castigasse tão duramente!
Também os homens não conseguiram compreender, aquilo que lhes era dito.
“Devemos nos entregar aos estranhos sem nos defender?” “Devemos abandonar nossas cabanas?” “Isto jamais pode ser a Vontade de Anu!”
“Desde quando vós não acreditais mais em mim?” perguntou Bu-anan tristemente.
“Nós acreditamos em ti! Perdão! Isso é tão terrivelmente difícil para nós!” exclamaram todos como crianças arrependidas.
Com grandes olhos admirados o estranho na pele de tigre olhava para esses fortes homens, que se deixaram conduzir pela suave voz de uma mulher. Uma beleza singular era própria à mulher. Onde ele já havia visto algo semelhante? Ele encarava a mulher.
Então ela o notou, ele, que estava parado imóvel não longe dela. Um movimento de sua mão chamou-o ao seu lado no círculo de seu povo. Ele obedeceu e já pensava involuntariamente:

“Agora eu também já a obedeço! E se for uma armadilha?”
“Estranho!” dirigiu-lhe a mulher a palavra, enquanto elevava os olhos para os seus. Que olhos profundos e vivazes eram aqueles!
“Estranho, eu não sei porque invadiste nossa aldeia. Se pensas em capturar presas, então saiba que te daremos voluntariamente o que possuímos. Se tu e teus guerreiros quiserem se apoderar de nós, mulheres e moças, saibas que Anu não o permitirá. Nós próprios não ergueremos nenhuma mão, pois Ele ordenou que não deveria cair nenhuma gota de sangue.”
O estranho estava admirado. Assim, nenhuma mulher ainda havia-lhe falado. Assim, jamais homens haviam se submetido.
Por que, afinal, ele havia invadido? Ele estava com seus guerreiros em uma expedição guerreira e ao mesmo tempo para caçar, então o claro caminho através do espinheiro havia chamado sua atenção e ele havia entrado por ele. Este caminho, porém, havia-o conduzido para uma aldeia conservada bem limpa, na qual muitas moças e mulheres bonitas estavam trabalhando.
Então os homens vieram correndo, acompanhados por uma gritaria sobre-humana, que lembrava a feras. Assim havia sido. Ele não queria absolutamente nada dessa gente. Será que deveria retirar-se novamente?
Mas eles mesmos haviam-lhe oferecido algo para que ele lhes deixasse livres. Ele seria um tolo se não aproveitasse!
“Fique calma, tu, bela”, queria ele falar, mas alguma coisa nos traços de Bu-anan impediu-lhe fizesse isso. Ele utilizou então a palavra “mulher”.
“Fique calma, mulher, não queremos nos aproximar nem de ti nem das outras mulheres e moças. Mas mande trazer aqui o que queres nos dar, para deixarmos que vocês continuem morando sossegados aqui.”
Ele falara em uma língua que se diferenciava apenas um pouco da língua dos Tuimahs. Todos podiam compreendê-lo. Apesar disso ninguém se mexeu, antes que Buanan desse o sinal para isso. Ela voltou-se para Ur-an que havia se achegado próximo a ela.
“Providencie que as coisas que estão prontas na forjaria sejam trazidas, e tu, Urana, providencie que as esteiras e os tecidos, os cintos e as vestimentas solenes que se encontram na cabana de provisões, sejam trazidas para cá.”
 Ur-ana ousou fazer uma pergunta:

“Nós também precisamos buscar as coisas que determinamos para o Filho de Anu?”

(continua)






Uma obra traduzida diretamente do texto original alemão de 1937, o qual foi publicado nos cadernos 6 a 12 da revista Die Stimme (A Voz). 
A história está sendo publicada em episódios da coleção do G +: 

África. (Nas Florestas da África)

Por esse mesmo esquema já foram publicadas as obras como coleções do G +: