quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Servir o Altíssimo Como Serviçal







Servir o Altíssimo Como Serviçal

por Charlotte Von Troeltsch e Susanne Schwartzkopf

Sinopse de Fatos Transcorridos: Peregrino vindo de local montanhoso coberto de neves eternas, confiante na ajuda de entes gigantes nativos de sua região, como invisíveis seres da natureza, que foram seus únicos amigos de infância, pois perdera seus pais desde cedo na vida; solitário se encontrava o jovem e inocente Miang, após se despedir de sua cabra de leite Fu-Fu, e ao se separar de seu primeiro mestre, em busca de mais assuntos ligados ao saber do Altíssimo, cujo local ainda deveria encontrar...  

“Então tu queres servir ao Altíssimo?” perguntou o gigante seriamente, e quando Miang confirmava animadamente, ele continuou:

“Eu tenho a incumbência de ajudar-te na tua próxima caminhada. Por hoje, porém, está muito tarde. Fique comigo. Quando o disco de fogo, que agora se despede de nós, novamente nos cumprimentar, eu irei te acordar.”

Confiantemente o menino recostou-se nos enormes membros, sob cuja proteção mal percebeu o vento sensivelmente frio da noite.

“Queres me dizer o que tu sabes do Todo Poderoso?” quis saber ele, e recebeu, porém, a resposta inesperada: “Para isso não tenho autorização.”

Quando o gigante notou a decepção de seu companheiro, continuou: “Lembra-te: quem te contou de nosso Senhor Todo Poderoso: Uru ou Muru?”

“Muru,” exclamou Miang, sem pensar.

“Este era o seu dever. Uru somente devia facilitar a caminhada. Eu, porém, sou como Uru. Os dons mais elevados me são negados. Creia-me, no reino de nosso Senhor, tudo está ordenado da maneira mais perfeita. Cada um se encontra exatamente no lugar que pode preencher. Para mais além ele não deve aspirar. Ele iria negligenciar os seus deveres.”

Perplexo, o menino refletiu sobre essas palavras, até que adormeceu e se encontrou sonhando, como lhe parecia.

“Como eu poderei servir-Te?” ouviu-se perguntar. E ouviu imediatamente a resposta da voz clara, que já conhecia:

“Isto tu saberás quando a tua preparação estiver concluída, não antes. Agora te é permitido continuar aprendendo. Amanhã serás conduzido a outro mestre. Aproveita o tempo com ele, que somente será curto.”

Na total consciência dessa ordem Miang acordou. Houve uma despedida rápida. Então seu novo amigo o levantou muito cuidadosamente por sobre os picos de rochas e desfiladeiros e colocou-o sobre um cume de montanha mais baixa. Aqui não havia pedregulho. Em toda parte brotava o verde. Mas antes que tivesse tempo suficiente para olhar ao redor, sentiu-se novamente apanhado por uma mão, que se estendia para ele de uma distância envolta por neblina. Desta vez seguiu em direção à origem da mão, e logo Miang encontrou-se no meio da neblina, novamente bem no alto das escarpas. Parecia que somente devia dar um rápido olhar para a beleza das áreas verdes.

Agora estava novamente diante de outro gigante, cujos dedos ainda o seguravam enquanto falava com ele. Parecia ser maior e mais rústico que os outros três. Nem perguntou de onde veio e para onde iria, mas ordenou rudemente:” Para lá, é onde espera o teu mestre!”

O menino agradeceu e, quando os dedos enormes o soltaram lentamente, prosseguiu na direção indicada. Sentia frio, apesar de ter confeccionado um traje dos pelegos de seu pai, que cobria o seu corpo inteiro. No entanto, não precisou ir muito longe e viu-se defronte de um desfiladeiro, que decaía verticalmente do lugar onde se encontrava. Na borda desse desfiladeiro estava um homem de média idade que deixava rolar pedras lá para baixo. Isso ocasionou o ruído inexplicável, que enchia o ar ao redor. Agora parou e virou a cabeça.

“Tu, vem e me ajuda!” ordenou ele ao menino surpreso.

“Esta pedra é muito pesada.”

Miang aproximou-se de bom grado, e apesar de suas forças serem poucas e não exercitadas, conseguiu empurrar o bloco de rocha para a profundeza, para a satisfação do laborioso homem. Qual seria a finalidade disso? Miang gostaria de ter perguntado, mas um olhar para o rosto pouco amável de seu companheiro fê-lo calar. Trabalharam juntos, sem falar, até que o sol se encontrasse alto no céu e as forças do menino ameaçavam faltar.

Aparentemente com desprezo o homem olhou para ele.

“Está na hora que entres a meu serviço. Deves tornar-te um homem e não um fracote.”

Com isso acenou para que Miang o seguisse. Eles se distanciaram do desfiladeiro e entraram numa fenda estreita na rocha. Após poucos passos esta se alargava e lá encontrou uma tenda feita de peles que, com o lado posterior, encostava na rocha. O interior da tenda estava aquecido.

“O que tu me trazes?” queria saber o homem, ao entrar.

“Somente a mim mesmo,” retrucou Miang timidamente. Foi realmente pouco o que ele trazia. Suspirou aliviadamente quando o homem lhe disse: “Então deves ganhar tu mesmo o teu sustento. Eu não dou nada de graça.”

Ao proferir essas palavras, ditas em tom áspero dirigiu-se ao fundo da tenda, de onde voltou com alguns pães chatos e uma bebida de leite coalhado. Ordenou que Miang sentasse num dos dois montes de peles. Então lhe ofereceu pão e o jarro.

Vorazmente bebeu o menino extenuado, que desde o dia anterior não tinha se alimentado e sentia falta do leite de cabra da Fu-Fu. Quando tinha colocado o jarro vazio no chão, tentou comer do pão. Nesse momento sobreveio-lhe o cansaço, ele caiu sobre as peles e adormeceu.

Sorrindo, o homem aparentemente tão duro olhou para o adormecido e, involuntariamente, os seus pensamentos tornaram-se uma prece:

“Todo Poderoso, eu Te agradeço por me julgares digno de preparar um de Teus servos. Abençoado é este menino. Não permitas que eu venha a esquecer minha missão de forjar dele um homem. Não me deixes amolecer!”

Primeiramente deixou o seu hóspede dormir e retornou sozinho ao seu trabalho, cujo ruído interrompia o silêncio, sem incomodar Miang.

Passado longo espaço de tempo, acordou Miang, fortificado e reanimado. Olhou ao seu redor. Ali estavam os pães. Também o jarro estava cheio novamente. Como o homem era amável! Era para ele um sinal de que tinha sido aceito no seu destino provisório. Comeu e bebeu cheio de gratidão, depois se lembrou da instrução da voz: “Aproveita o teu tempo, que será de curta duração.” Por isso, não deveria demorar-se observando a tenda exótica, deveria voltar rapidamente ao trabalho, que o aproximaria de seu novo mestre.

(continua)

Trecho extraído do livro: Miang Fong, como relato sobre a vida do grande Portador da Verdade, que libertou o Tibete das trevas.