terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Sobre a Vida dos Celtas IX





Para leitura do episódio anterior: Sobre a Vida dos Celtas VIII


Sobre a vida dos Celtas –IX

Por Charlotte von Troeltsch e Suzanne Schwartzkoff

Anteriormente: Após o ritual fúnebre de reações chocantes, depressivas e intoleráveis, pela morte misteriosa de Padraic ficou a cargo de Seabhac Habicht, como sempre no comando geral, providenciar meios para a escolha inevitável do novo chefe dos druidas, conforme situação que virou o assunto mais importante da comunidade...


Logo no dia seguinte começou a instrução, contudo, antes Seabhac andou de cabana a cabana, elogiou e admoestou, e assim provou aos homens que com ele não se brincava. O que ele dizia, deveria ser realmente feito.
Eles estavam aguardando dele palestras, as quais eles poderiam ouvir se quisessem ou não. Ele, porém, começou questionando. Daí a arrogância deles caiu por terra, pois quase ninguém sabia responder as mais simples perguntas. Então, realmente se envergonharam e procuraram por instrução junto a ele, o qual recebia sabedoria do próprio Pai Eterno.
Chegara a época da próxima festa. Ainda não havia nenhum druida superior e por muito tempo ainda não haveria de ter nenhum. Eles não ousavam perguntar quem deles iria falar ao povo. Finalmente, alguns dias antes da lua cheia, Seabhac ordenou aos sacerdotes que preparassem tudo como na festa anterior, portanto, sem sacrifícios. Ele próprio falaria às pessoas de modo especial.
Apenas na manhã do dia da solenidade ele comunicou aos druidas, que as mulheres e moças mais velhas, a partir de então, também participariam. Ele escolheu entre os sacerdotes aqueles que deveriam indicar ao povo os seus lugares. Em torno da pedra de sacrifícios os druidas encontrariam novamente seu lugar. Depois deles viria um círculo mais amplo de mulheres, depois os alunos dos sacerdotes e, por fim, os homens.

— “Nós nos apertaremos um pouco mais do que antes no espaço no interior das pedras” disse Seabhac refletindo. “Eu acho melhor que nós nos comprimamos um pouco mais, a que os homens fiquem fora do círculo das pedras. Talvez o Pai Eterno permita que nós ampliemos tal círculo para a próxima solenidade.”
A entrada das mulheres ocorreu de forma bem impressionante. Curto fora o tempo em que Meinin teve para preparar tudo, mas o zelo e a felicidade das mulheres a auxiliaram. Então, naquele momento ela caminhava em uma vestimenta branca diante das outras mulheres, as quais estavam igualmente vestidas com roupas claras e flores nos cabelos soltos e nas mãos, entrando no interior do círculo de duas em duas. Elas ocuparam rapidamente os seus lugares e depois delas os alunos formaram uma corrente ao seu redor, então vieram os homens, comprimindo-se bem. Como antigamente, em seguida vieram os druidas, ocupando sua posição na parte central. Seabhac postou-se ao lado da pedra de sacrifício. Poderosa soou sua oração ao Pai Eterno. Ele acusou a si e a todos por terem esquecido o mais elevado Mandamento. Ele prometeu melhora para si e para todos.
Totalmente inesperado para os presentes soou então o canto das mulheres. Depois disso, o príncipe disse:
— “Da última vez nós começamos a fazer sacrifícios de espécie diferente do que antigamente. Também desta vez nós queremos sacrificar novamente a nós próprios, na pressuposição sincera que aquilo que lançamos ao fogo para a honra do Pai Eterno, não volte mais à vida. Contudo, iremos realizar isso em silêncio. Cada um que lance nos próximos instantes sua oferenda sobre a pedra de sacrifício, sobre a qual acenderei agora as chamas. Contudo, ninguém acredite que poderá permanecer aqui como um espectador à parte. Os mensageiros luminosos do Pai Eterno se encontram entre nós e analisam cada um. Quem não quiser sacrificar nada também não participará da bênção do Pai Eterno.”

Profundo silêncio imperou enquanto Seabhac colocava sobre a pedra os recipientes de sacrifício, que um sacerdote lhe havia dado. Um aromático incenso queimava ali. Os recipientes, porém, eram muito bonitos de se ver, do modo como eles reluziam no brilho das chamas, mostrando as cores de suas pedras preciosas.
Então Seabhac postou-se silenciosamente e olhou para a grande multidão reunida. Ele viu muita vontade verdadeira e sincera, contudo, também obstinação e revolta junto a alguns. Indiferença não podia ser notada em nenhum lugar.
Então as mulheres começaram novamente a cantar. As cabeças abaixadas dos homens ergueram-se, eles ouviam as palavras e alegravam-se com elas. Seabhac, porém, anunciou então a respeito do Pai Eterno e de Sua inesgotável bondade. Ele falou por longo tempo ao povo, contudo, isso não se tornou penoso a ninguém. Uma profunda oração finalizou a solenidade.
Em casa Seabhac agradeceu a sua esposa pelo canto. Ele havia auxiliado a abrir os corações. Isto encorajou Meinin a deixar-se presentear sempre de novo com novas canções, as quais ela então ensinava às moças e mulheres. Junto com isso ela as instruía no saber a respeito do Pai Eterno, assim como Seabhac fazia em relação aos druidas, os quais pouco a pouco se modificavam radicalmente. Eles não eram mais capazes de compreender sua vida enredada de outrora, sem alegria e misturada com toda sorte de superstições.

Apesar do trabalho aplicado de Meinin entre as mulheres, isso não impediu que surgisse uma criancinha – nascida – na cabana do chefe da tribo.
— “O menino deve se chamar Cuimin, igual a teu pai, Seabhac” disse a avó Muirne.
Seabhac, porém, não estava de acordo com isso. Ele queria chamá-lo pelo nome de Fionn, como o pai de Meinin. Como, então, eles não conseguiam chegar a um acordo, Seabhac perguntou ao mensageiro luminoso qual nome de preferência deveria ser.
— “Chama teu filho de Pieder” soou a resposta. “O segundo chamas então de Cuimin e o terceiro de Fionn.”
Sorrindo, Seabhac contou a sua esposa o que ele ficara sabendo. Ela alegrou-se e disse que estava certo, então, seria assim.
Muirne (sua mãe), porém, havia se irritado e não quis saber nada mais do menino. Ao invés de cuidar dele como avó, quando Meinin ia ensinar em outras casas, ela saía igualmente na mesma hora, deixando a criança entregue a si própria. Então Meinin acostumou-se a levar o pequeno junto a toda a parte. E ele ficava tão quieto que absolutamente não incomodava.
Quando ele já tinha alguns meses de idade parecia a todas as mulheres como se ele ouvisse atentamente aos ensinamentos de sua mãe. Seus olhos irradiavam muitas vezes quando Meinin anunciava a respeito do Pai Eterno e a primeira palavra que ele falou clara e nitidamente foi Pai Eterno.

Nesse meio tempo os ensinamentos de Seabhac junto aos druidas não haviam sido em vão. Dois dos sacerdotes haviam ido embora furtivamente, os outros se uniram ainda mais firmemente. Já há muito tempo eles haviam deixado de revoltar-se interiormente contra Seabhac. Era-lhes indiferente que ele não fosse nenhum druida, depois que sentiram que seu saber provinha do reino do Pai Eterno.
Então, um dia chegou a mensagem a Seabhac, que estava na hora de escolher um druida superior e transmitir a ele a realização das solenidades. Outro trabalho aguardava Seabhac. Ao mesmo tempo o mensageiro luminoso esclareceu de forma bem exata como deveria ser realizada a escolha, de modo que Seabhac fosse confiantemente ao encontro dessa realização.
Ele chamou os druidas, reunindo-os e pediu que um deles saísse país afora. Atrás do grande pântano estava um homem à beira da morte, que ansiava muito por um sacerdote.
Eles entreolharam-se e abaixaram os olhares embaraçados. Eles aparentavam que nenhum tinha vontade de sair para essa finalidade, o que além do mais poderia tornar-se perigoso e arriscado à vida.
— “Eu já sou muito velho para uma missão de tal espécie” explicou o mais velho, que não podia esperar até que se tornasse druida superior.

— “Eu sou muito jovem para consolar um homem velho, o que é, pois, evidente” esclareceu um dos mais jovens. Outros não se achavam suficientemente hábeis e outros, por sua vez, não sabiam lidar com as pessoas. Enquanto eles se acumulavam de desculpas querendo, contudo, passar com prazer a tarefa a outrem, um dos druidas afastou-se sem chamar a atenção. Agora ele apresentava-se para a dura peregrinação já vestido, os pés envolvidos com peles e na mão direita um forte bastão, dirigindo-se a Seabhac e pedindo pelo nome do homem que estava a falecer e o local em que se encontrava.
Então, Seabhac exclamou alto:
— “Vede aqui! Donald não ficou a falar continuamente, ele agiu. Ele será futuramente vosso superior, segundo a ordem do Pai Eterno!”


(continua)



Texto da série especial denominada: Escritos Valiosos

Personagens e fatos processados dentro do contexto deste episódio:

Seabhac, Habicht: Se trata do personagem de destaque nos acontecimentos, que se situa como soberano de uma comunidade celta.

Muirne: velha mãe do príncipe dos celtas Seabhac, Habicht  

Muirne: esposa de Seabhac, Habicht que veio de outro reino salva e aceita para proteção.

Padraic: É o nome principal do ancião que surge neste episódio como druida da comunidade celta, sendo, portanto um personagem influente de seu meio.

Nuado Silberhand: No folclore irlandês, era reverenciado como rei e grande líder dos Tuatha Dé Danann. Possuía uma espada invencível, vindo da cidade de Findias e que fazia parte dos Tesouros de Dananns. Na primeira Batalha de Magh Turedh perdeu o braço ou a mão, órgão que foi restituído, mas fez com que ele perdesse o trono da tribo. Ficou conhecido como "Nuada, Braço de Prata" ou "Nuada, Mão de Prata". Nuada era o Deus da justiça, cura e renascimento; irmão de Dagda e Dian Cecht.
Pelo direcionamento dado a este enredo pelas autoras, este personagem se trata de um enteal de certa forma importante em sua ligação com os seres humanos.

Goban: deus ferreiro dos Tuatha Dé Danann; com Credne e Luchtain formavam o "Trí Dé Dana"; fez as armas que os Tuatha usaram para derrotar os Fomorianos. Equivalente a Goibniu e Govannon (galês).
Na mitologia irlandesa Goibniu ou Goibhniu era um dos filhos de Brigid e Tuireann e ferreiro dos Tuatha Dé Danann. Ele e seus irmãos Creidhne e Luchtaine tornaram-se conhecidos como os Trí Dée Dána, "os três deuses de arte", que forjaram as armas que os Tuatha Dé usaram para combater os Fomorianos. Suas armas eram sempre letais e seu hidromel concedia invulnerabilidade a quem o bebesse.

Brigit, é a Deusa dos ferreiros, dos artistas, das artes e da cura. Sendo uma Deusa solar, ela é padroeira do fogo e de tudo que envolva Inspiração e Artes. É uma Deusa tríplice, tendo três faces, a poetisa, a médica e a ferreira.

Lug: ou Lugh - filho de Cian (Kian) dos Tuatha Dé Danann e Eithne (também Etaine), filha de Balor (rei dos Fomorianos). Comandou as forças dos Tuatha na vitoriosa Segunda Batalha de Mag Tuireadh (Moytura) contra os Fomorianos, na qual matou o avô Balor. É a figura extraordinária do Deus jovem irlandês que suplanta o Deus Velho; está associado à habilidade e à técnica; é conhecido como Lugh Samhioldanach (de muitas artes) e Lugh Lámhfhada (de mão comprida). Raiz da palavra gaélica que significa Agosto (Lúnasa), isto é, Lughnasadh (festa de Lugh). Corresponde ao Lleu Llaw Gyffes galês.