O jovem rico
por Susanne Schwartzkopff
Mateus
19, 16-22
E
eis que, aproximando-se dele um homem, disse-lhe: Bom Mestre, que devo fazer de
bom para conseguir a vida eterna?
Ele,
porém, lhe disse: Por que me chamas bom? Ninguém é bom senão um só, que é Deus.
Se queres, porém, entrar na vida, guarda os Mandamentos.
Disse-lhe
ele: Quais? E Jesus disse: Não matarás, não cometerás adultério, não furtarás,
não darás falso testemunho.
Honra
pai e mãe, e amarás o teu próximo como a ti mesmo.
Disse-lhe
o jovem: Tudo isso tenho guardado desde a minha mocidade, que me falta ainda?
Disse-lhe
Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende o que tens e dá-o aos pobres, e terás
um tesouro no céu. Então vem, e segue-me.
E
o jovem, ouvindo esta palavra, retirou-se triste, porque possuía muitas
propriedades.
❦
Deixemos
o jovem rico surgir mais uma vez diante dos nossos olhos, assim como ele fora a
Jesus, com anseio e esperança no coração.
Não
é uma parábola o que a escritura nos narra aqui. É um fato verdadeiro que
Mateus esboçou para a posteridade. E ainda hoje ele tem algo a nos dizer.
O
que será que levou o jovem a perguntar pela vida eterna? Ele não tinha tudo o
que o ser humano pode desejar para si: dinheiro e propriedade, reputação
perante as pessoas e uma vida despreocupada?
Mas
aí é que está o problema. Falta a essa vida a pressão do precisar lutar, a qual
mantém desperta as forças, o estímulo para conquistar algo. Assim a vida
tornou-se-lhe vazia e sem graça. Saturado ele estava disso, supersaturado. E
assim despertou mais outra fome – a fome pelo que é imperecível, eterno. Para
isto deveria ser encontrada uma satisfação, que fosse permanente. E a ele, o
rico, não deveria ser difícil “fazer o bem”, com o que abriria para si o
caminho para a vida eterna. Até agora tudo havia lhe caído no colo, tudo fora
conquistado facilmente. Apenas isto ainda lhe faltava. E veio-lhe um
pressentimento que apenas poderia encontrar a resposta ao seu anseio junto a
Jesus. Assim ele partiu e foi a sua procura. E agora estava diante dele e lhe
apresentava, suplicando, a pergunta.
Mas
a resposta “guarda os Mandamentos”, o decepcionou. Isto não era nada de novo.
Os Mandamentos ele conhecia desde criança, e os havia guardado. Ele não se
tornou ladrão, assassino e adúltero. Ele dava de sua riqueza aos pobres,
portanto, amava seus semelhantes. Não, esta resposta não o satisfez. Cansado,
respondeu que tudo isso ele já tinha feito.
Será
que o Filho de Deus queria analisá-lo com sua resposta? Será que queria ver
quão sério o jovem tomava seu anseio? Ele olhou-o profundamente no seu coração e
ali encontrou aquilo que era um obstáculo para a ascensão desse ser humano. Sua
riqueza era o que ele amava, apesar de tudo a que estava acostumado a fazer.
Aqui, neste lugar ele precisava se soltar, libertar-se, então poderia tomar o
novo caminho, e Ele, o Filho de Deus, ofereceu-lhe a mão: Vem, e segue-me!
Mas
a condição que ele apresentou era muito difícil para este ser humano, a quem a
riqueza já havia amolecido. Consternado ele se virou. A única coisa que ele não
podia, era-lhe exigido – não, não era possível!
E
triste, o Filho de Deus viu mais uma vez o funesto poder que tinha a posse, que
era mais forte do que o anseio pela liberdade do espírito.
E
desta história se quis interpretar uma renúncia pela riqueza. Na história do
cristianismo acham-se muitos exemplos de renúncia voluntária para se ficar na
pobreza. Ainda hoje, muitas vezes, a pobreza tomada sobre si voluntariamente é
considerada como especialmente agradável a Deus.
Mas
o Filho de Deus falara apenas para este jovem que havia se acorrentado aos seus
bens. Ele mesmo não vivia na miséria, como se acredita muitas vezes
erroneamente. Sua vida de peregrinação se dava pela necessidade de divulgar sua
doutrina verbalmente o mais distante possível. Jesus provinha de uma casa
abastada e não conhecia nenhuma necessidade. Será que o Criador deixara surgir
os bens desta Terra, para que nós os evitássemos? Não podemos nos alegrar com
toda a abundância que a Terra produz? Devemos recusar e desprezar as dádivas do
Onipotente? Não, isso não pode repousar em Sua vontade cheia de amor. Apenas
devemos utilizá-las direito.
Há
duas espécies de riqueza. Uma é apenas uma posse rígida, um ter e não querer
mais soltar. Essa riqueza é morta. E há uma riqueza que não é uma posse rígida,
mas sim uma obrigação, e essa é viva. Ela cria para muitas pessoas a
possibilidade de fazerem algo para se libertar e se desenvolver para
tornarem-se membros independentes da sociedade. Se ela for utilizada assim,
então a riqueza é urna bênção e ela aumentará na mão certa. Se, porém, ela for
utilizada apenas para fins de poder e prazer, então ela se acaba assim como foi
ganha.
O
que esta história quer nos dizer? “Nós não somos ricos”, sai rapidamente de
nossos lábios.
Será
que realmente não? Será que, talvez, não tenhamos uma riqueza, da qual também
não queremos nos desfazer? Analisemo-nos: como estamos em relação a isso?
Aí,
um não quer se separar de seus sucessos, ele se apraz na estima das pessoas.
Quando sua capacidade começa a diminuir, ele não quer acreditar. Quão rico ele
se sente, e essa riqueza ele deve entregar? De forma alguma!
Então
há pais que não querem deixar seus filhos tornarem-se independentes. Estes
devem permanecer crianças ainda por muito tempo; os pais não querem dar o passo
para o próximo degrau do amadurecimento. Pessoas hábeis, que produzem muito,
separam-se com muita dificuldade de seu campo de atividade. Elas “pendem” em
seu serviço com uma tenacidade que não pode ser quebrada. E, com isso, elas
negligenciam o próximo passo que as levaria a uma nova etapa. Por medo de
perder algo, nós, seres humanos, atamo-nos a invólucros mortos e vazios. E um
dia não nos é poupado reconhecer o vazio, a aparência não se deixa manter por
muito tempo. Então teremos negligenciado bastante – na verdade, a oportunidade
de ter dado, na hora certa, o próximo passo na nossa peregrinação através da
vida.
Para
cada idade, para cada grau de amadurecimento há novas tarefas na vida humana.
Mas para isso precisamos ser capazes de não nos prendermos. A história do jovem
rico quer nos mostrar, de forma séria e exortadora, que não devemos querer nos
prender ao que é perecível e nem nos atar à riqueza morta.
Apenas
uma vez ele pôde apresentar essa pergunta decisiva, apenas uma vez ofereceu-se
a oportunidade. Então a sorte foi decidida e o portal para o caminho, que o
teria conduzido para cima, fechou-se para ele.
Não
negligenciemos a oportunidade! Muito depende disso. Larguemos o que tem um fim.
Larguemos o que quer nos atar, fiquemos livres e também deixemos a liberdade
aos outros. Isso pode decidir destinos.
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Extraído do
livro: Petri Fischzug – Gedanken zu Gerichten der Bibel (A Pesca de Pedro – Pensamentos sobre relatos da Bíblia).