No
País da Penumbra
por Abdrushin
Deixa-te guiar, alma humana, um passo para dentro do reino da
matéria fina! O país das sombras vamos percorrer sem demora; pois dele já
falei. É aquele país, onde têm que permanecer aqueles, que
ainda são demasiadamente broncos para se utilizar corretamente de seu corpo de
matéria fina. Exatamente todos aqueles, que aqui na Terra consideravam-se
excepcionalmente sagazes. No reino da matéria fina são mudos, cegos e surdos,
porque o intelecto terreno, como produto de seu corpo de matéria grosseira, não
pôde vir junto até aqui, mas sim permaneceu nos limites restritos, que ele, por
estar preso à Terra, jamais pode transpor.
A primeira consequência de seu grande engano tornar-se-á
evidente a uma alma humana logo depois da morte terrena, por se encontrar
inepto no reino da matéria fina, desamparada e fraca, muito pior do que uma
criança recém-nascida na Terra de matéria grosseira. Por isso, são chamadas de sombras.
Almas, que ainda intuem sua existência, mas não conseguem ficar conscientes
disso.
Deixemos agora para trás esses tolos, que nesta Terra, querendo
saber tudo melhor, tagarelavam o bastante sobre coisas insignificantes e agora
têm que ficar calados. Entramos na planície da penumbra! Um
sussurro chega ao nosso ouvido, bem consentâneo com a pálida luz da penumbra,
que nos rodeia e deixa reconhecer, de modo impreciso, contornos de colinas,
prados e arbustos. Tudo aqui está coerentemente sintonizado
à penumbra, o que pode acarretar um despertar. Mas
somente pode, não acaso deve!
Aqui não é possível nenhum som livre e alegre, nenhuma visão
clara. Apenas um semi-despertar ou um permanecer reprimido, consentâneo com o
estado das almas, que aqui se encontram. Todas elas têm um movimento lânguido,
deslizando cansadas, apáticas, exceto um indefinido impelir para aquela uma
direção, onde, ao longe, parece emergir um tênue róseo, que, anunciando luz,
atua como doce encantamento sobre as almas aparentemente tão cansadas. Almas
apenas aparentemente cansadas; pois são preguiçosas no
espírito, por isso, seus corpos de matéria fina são fracos.
—
O vislumbre róseo na distância longínqua acena de modo
prometedor! Despertando esperanças, incentiva à movimentação mais ativa. Com o
desejo de atingir esse vislumbre, os corpos de matéria fina aprumam-se mais e
mais, em seus olhos surge a expressão de uma conscientização mais forte e, cada
vez mais firmes, seguem naquela uma direção. —
Nós caminhamos junto. O
número de almas ao nosso redor aumenta, tudo se torna mais móvel e mais nítido,
o falar torna-se um pouco mais alto, transforma-se em um forte murmúrio, de
cujas palavras depreendemos que os que avançam proferem orações,
incessantemente, de modo apressado, como que em estado febril. As massas
tornam-se cada vez mais densas, o avançar transforma-se em um empurrar, grupos
estancam diante de nós, são compelidos para trás pelos precedentes, para
novamente pressionar para frente. Assim, passa um ondular sobre as massas
aglomeradas, das orações elevam-se gritos de desespero, palavras de medo
suplicante, de tímida exigência, e, aqui e acolá, também sufocado lamento da
maior desesperança! —
Passamos rapidamente por cima da luta de milhões de almas e
vemos que diante delas se encontra, de modo rígido e frio, um obstáculo ao
prosseguimento, contra o qual investem em vão, que banham inutilmente com as
lágrimas.
Barras grandes e fortes, mui próximas umas das outras, impõem de
modo inexorável parada ao seu avanço! —
E mais forte incandesce ao longe o róseo vislumbre, mais
ansiosos arregalam-se os olhos daqueles, que o escolheram como alvo.
Suplicantes são estendidas as mãos, que convulsivamente ainda se agarram aos
rosários, deixando correr as contas por entre os dedos, uma após outra,
balbuciando! As barras, porém, permanecem inabaláveis, rígidas, separando do
belo alvo!
Passamos ao longo das densas filas. É como se não tivessem fim.
Não centenas de milhares, não, milhões! São todos aqueles, que na Terra
julgavam-se “fiéis” sérios. Quão diferente haviam imaginado tudo! Acreditavam
que seriam alegremente aguardados, seriam dadas respeitosamente as boas-vindas.
Bradai-lhes: “O que vos adianta, ó fiéis, a vossa prece, se não
deixastes a Palavra do Senhor tornar-se ação, evidência em vós próprios!
O vislumbre róseo ao longe é a saudade pelo Reino de Deus, que
arde dentro de vós! Tendes dentro de vós a saudade dele, mas obstruístes o
caminho para lá com formas rígidas de concepções erradas, as quais vedes agora
diante de vós como barras que impedem, igual a uma grade! Deixai cair aquilo
que assimilastes de concepções erradas durante a existência terrena, aquilo que
construístes para vós próprios nesse sentido! Lançai fora tudo e ousai levantar
o pé livremente em prol da Verdade, como ela é em sua grande e
simples naturalidade! Então estareis livres para o alvo de vossa saudade!
Mas vede, não o ousais, no constante medo de que poderia talvez
estar errado aquilo, que assim fazeis, porque até agora pensastes
diferentemente! Com isso, vós próprios vos tolheis e tendes que permanecer onde
estais, até ser demasiado tarde para o prosseguimento e terdes que sucumbir
junto na destruição! Não vos poderá ser auxiliado nisso, se vós próprios
não começardes a deixar o errado para trás de vós!”
Bradai, pois! Bradai a essas almas o caminho para a salvação!
Vereis que é totalmente em vão; pois somente mais forte recrudesce o ruído das
infindáveis orações, e impede que esses rogadores escutem
qualquer palavra que lhes poderia permitir caminhar para diante, ao
encontro do vislumbre róseo e da luz. Assim, têm que ficar perdidas agora, não
obstante alguma boa vontade, como vítimas de sua indolência, que não as deixou
reconhecer mais, nem deixou assimilar mais do que
as exterioridades de suas igrejas, templos e mesquitas. —
Entristecidos, vamos prosseguir. – Mas ali, diante de nós, está
uma alma de mulher, em cujo rosto espraia-se subitamente uma serenidade cheia
de paz, um novo brilho surge em seus olhos, que até agora olhavam cismando e em
temerosa reflexão, tornando-se mais consciente, ela se apruma, torna-se mais
clara... forte vontade da mais pura esperança faz com que erga o pé... e,
respirando aliviada, encontra-se além das barras! Para essa alma de
mulher as barras não constituíam mais qualquer impedimento, pois na profunda
reflexão, intuindo com sensibilidade, chegou à convicção de que tudo aquilo que
até então imaginava tinha que ser errado, e, sem receio, na alegre fé no amor
de Deus, lançou de si esse errado.
Surpresa vê agora quão fácil isso foi. Agradecendo, ergue seus
braços, e uma inenarrável sensação de felicidade quer se manifestar em júbilo,
no entanto, isso lhe sobreveio demasiadamente forte, demasiadamente poderoso,
os lábios permanecem mudos, sua cabeça se inclina com leve estremecer, os olhos
se fecham e pesadas lágrimas correm vagarosamente pelas suas faces, enquanto
suas mãos se juntam para uma oração. Para uma oração diferente do
que até então! Para um agradecimento! Para uma grande intercessão em favor de
todos aqueles, que ainda se encontram atrás dessas rígidas barras! Por causa da
própria concepção, que não querem abandonar como errada!
Um suspiro de profunda comiseração enche-lhe o peito, e, com
isso, desprende-se dela como que uma última algema. Está agora livre, livre para
o caminho rumo ao alvo por ela interiormente almejado!
Erguendo o olhar, vê diante de si um guia, e alegremente lhe
segue os passos para o novo e desconhecido país, ao encontro do vislumbre
róseo, que cada vez se torna mais intenso! —
Assim, outras almas se desprendem ainda daquelas massas que,
atrás das barras das concepções errôneas, têm de esperar por sua própria
decisão, por sua própria resolução, que pode conduzi-las adiante, ou retê-las
até a hora da destruição de tudo aquilo, que não pode cobrar ânimo para
abandonar o errado antigo. Somente poucas ainda se salvarão dos liames das
concepções errôneas! Estão demasiadamente emaranhadas nelas. Tão rígidas como o
seu agarrar a isso são também essas barras, que lhes impedem um prosseguimento
para a ascensão. Estender-lhes as mãos para vencer esse impedimento é
impossível, porque para isso incondicionalmente se faz necessária a
decisão própria das almas. O próprio vivenciar
dentro de si, que proporciona movimento a seus membros. Desse modo, pesada
maldição recai sobre todos aqueles, que ensinam idéias errôneas às criaturas
humanas a respeito da vontade de Deus na Criação, a qual outrora podia ser
encontrada na Palavra do Salvador, mas que não permaneceu pura no texto da
Bíblia, menos ainda nos esclarecimentos terrenos.
Deixai-as em sua obstinação continuar a recitar monotonamente
orações, na ilusão de que a quantidade destas possa e deva lhes ajudar, porque
a Igreja assim o ensinou, como se a vontade de Deus se deixasse mercadejar.
Prosseguimos pelo país da penumbra. Interminável parece o
baluarte dessas barras, atrás do qual, a se perder de vista, empurram-se os
retidos por ele . —
São, porém, outros. Grupos que, ao invés de rosários, seguram
Bíblias nas mãos e nelas procuram desesperadamente. Aglomeram-se em redor de
algumas almas que, doutrinando, querem dar informações, ao ler, sempre de novo,
trechos da Bíblia. Exigindo, várias almas exibem aqui e acolá suas Bíblias, de
joelhos, elas são erguidas muitas vezes como em oração... as barras, todavia,
persistem, impedindo-as de prosseguir.
Muitas almas insistem em seu conhecimento da Bíblia, algumas, no
seu direito de entrar no reino do céu! Mas as barras não oscilam!
Eis que uma alma de homem, sorrindo, abre passagem entre as
filas. Vitorioso, acena com a mão.
“Tolos”, brada, “por que não quisestes ouvir? Já gastei a metade
de minha existência terrena estudando o Além, portanto, para nós agora o Aquém.
As barras, que vedes diante de vós, desaparecerão depressa por um ato de
vontade, elas são criadas pela ilusão. Segui-me apenas, eu vos guio! Tudo isso
já é familiar para mim!”
As almas em seu redor deram-lhe passagem. Ele avança para as
barras, como se não existissem. Com um grito de dor, contudo, cambaleando recua
subitamente. O choque foi duro demais e convenceu-o mui rapidamente da
existência das barras. Com ambas as mãos ele aperta sua testa. As barras diante
dele continuam inabaláveis. Com um acesso de cólera, ele as agarra e sacode-as
impetuosamente. E grita com raiva:
“Então fui enganado pelo médium! E gastei ano após ano nisso!”
Não reflete que foi ele quem gerou os erros e
propalou-os pela palavra e pela escrita, após ter interpretado as imagens,
dadas pelo médium, segundo suas acepções, sem primeiro estudar
as leis de Deus na Criação.
Não procureis ajudar esse homem ou outrem; pois todos se acham
tão convencidos de si, que nem querem ouvir algo diferente do que o próprio
intuir. Primeiro terão que se cansar disso, conhecer ou reconhecer a
inutilidade, onde unicamente está ancorada a possibilidade de ainda escapar
desse emaranhado de convicções errôneas, após longo vagar pelo país da penumbra.
Elas não são más pessoas, mas sim tais, que pura e simplesmente
se aferraram apenas a concepções errôneas no seu procurar, ou que foram
demasiado preguiçosas para meditar profundamente a respeito de tudo, ao invés
de examinar com a mais cuidadosa intuição, se aquilo, que foi recebido, pode
ser considerado como certo ou se contém lacunas, que em uma sadia reflexão
intuitiva não são mais capazes de se manter como naturais. Deixai, portanto,
cair as vazias exterioridades!
Tudo quanto é místico, o espírito humano afaste de si, uma vez
que jamais lhe pode trazer um proveito. Somente o que ele mesmo intui de modo
nítido, levando assim ao próprio vivenciar dentro de si, ser-lhe-á de proveito
no amadurecimento de seu espírito.
A palavra “Desperta!”, que Cristo empregou com
frequência, quer dizer: “Vivencia!”. Não passes dormindo ou
sonhando pela existência terrena. “Ora e trabalha” significa: “Faze do
teu trabalho uma oração!” Espiritualiza aquilo que crias com
tuas mãos! Cada trabalho, em sua execução, deve tornar-se uma adoração cheia de
respeito a Deus, como agradecimento pelo que te é dado por Deus, de realizar
algo de extraordinário entre todas as criaturas desta Criação posterior, bastando
que apenas queiras!
Principia em tempo com o despertar, com o próprio vivenciar
interior de tudo, o que equivale ao consciente intuir, também do que lês e
ouves, para que não tenhas que permanecer no país da penumbra, do qual hoje
esclareci apenas uma bem pequena parte.