Para leitura do trecho anterior: Sobre a Vida dos Celtas II
Sobre a vida dos Celtas – III
Por
Charlotte von Troeltsch e Suzanne Schwartzkoff
Anteriormente: Seabhac, Habicht entra em acordo com o druida
Padraic pela proibição – vinda como exigência do alto – da
prática do sacrifício humano, no culto dos druidas...
Das
outras cabanas vinham agora os “sub - druidas” com os jovens alunos. Eles
reuniram-se em torno de ambos e pai Padraic comunicou-lhes que resolução ele
havia tomado há pouco. O pensamento a respeito de que no futuro deveriam ficar
descartados os sacrifícios agradou sobremaneira os mais jovens. Especialmente
os alunos que se enojavam diante disso e um deles, muito vivaz de um país mais
ao sul com o nome de Merwin, exclamou
entusiasmado: “Como o Pai Eterno alegrar-se-á quando não mais se elevar até Ele
nenhuma exalação de sangue! Talvez Seus servos presidam nossa festa!”
Seabhac
despediu-se, a fim de retornar à sua casa. O coração dele estava repleto de
gratidão. Acima de toda a expectativa a difícil tarefa havia dado certo. Ele
sabia muito bem que a bondade do Pai Eterno lhe havia auxiliado. Ele ainda não
havia caminhado muito, quando outro ser luminoso aproximou-se dele. Ele não
parecia tão elevado quanto Nuado, era
um pouco mais denso e também algo menor. Mas também ele possuía o andar leve,
como que pairando no ar de imagem clara, quase transparente.
Era Gobban
também servo do Pai Eterno, o qual havia ensinado aos seres humanos a construir
e também lhes instruído como forjar armas e ainda trabalhar o bronze como
ornamento. Uma enorme quantidade de pequenos entes era, por sua vez, servos
dele, os quais, sem descanso, traziam das montanhas o que Gobban queria para que fosse trabalhado.
— “Eu ouvi teus esforços para com o pai Padraic, a fim de que ele chegasse a um
reconhecimento, Seabhac” disse-lhe alegremente.
“Onde deixastes tua impaciência e teu ser de costume áspero?”
— “O Pai Eterno lhes pôs um limite, pois assim
eles tiveram que se conter” riu o chefe dessa indagação. Então ele levantou o
olhar para Gobban. Também este só
aparecia quando era preciso falar algo especial.
— “Ouça, Seabhac, seria bom se desses aos druidas novos incensórios para a
festa. Os antigos estão conspurcados pelo sangue das vítimas. Nem para Lug, o maldoso, eles são
suficientemente bons. Eu vim para te oferecer ajuda, para que três de teus mais
hábeis homens venham ao velho local de forja na floresta. Eu próprio quero lhes
instruir a respeito do trabalho. Mas ordene que eles fiquem em silêncio! Não é
bom que se fale em demasia a respeito das graças do Pai Eterno.
Seabhac agradeceu e prometeu escolher cautelosamente os homens.
Depois disso, eles se separaram. Eles haviam se aproximado mais das cabanas.
Algo
maior e mais destacável era a sua cabana como chefe que se situava no meio das
outras. Sua mãe vivia ali junto dele e mantinha a casa e as coisas em ordem.
Muirne, assim chamava-se sua mãe, que era muito velha. Ela parecia pequena e
ressecada, mas seus olhos ainda podiam brilhar como da mulher ovem e com suas
mãos magras ainda trabalhava aplicadamente. E disso advinha o fato de Seabhac ainda não ter tido motivo para
se casar, pois ele estava muito bem provido.
Também a velha havia pensado pouco a
respeito de que ainda faltava mulher para seu filho. Ele ainda estava
suficientemente jovem para poder, a qualquer hora, desposar alguém. A esse
respeito não se fazia muitas cerimônias. Quando na comunidade uma moça interessava
a um homem, então era costume perguntar ao pai desta quanto ela custava. Se
eles chegassem num acordo para a negociação, então a moça tinha de ir com
aquele que (pelo preço quitado) a escolhera. Eles não recebiam bênçãos e
ninguém mais se preocupava com ambos. Era coisa totalmente particular deles, da
forma como então eles se entendiam. A mulher tinha de zelar pelo bem-estar do
esposo e a manutenção da casa; e tão logo viessem os filhos ampliando a
família, ela também tinha que cuidar deles e, juntamente com tudo isso, criar
algum animal para que os filhos tivessem alimento. Se o homem fosse abastado,
então ele comprava para ela servos dos que foram feitos presos anteriormente ou
então ele saía para formar suas próprias “moças cativas” junto à divisa. Se
faltassem servas, estas então eram igualmente roubadas ou compradas por moças
disponíveis nas tribos vizinhas. No mais o homem tinha que prover e cuidar da
alimentação. Ele saía para caçar ou pescar, juntava frutas ou trazia grãos de
cereais que nasciam espontaneamente.
Se o homem não se esforçasse o suficiente
para a alimentação da família, então a mulher podia reclamar junto aos
sacerdotes, os quais faziam com que o homem cumprisse seus deveres.
Se a mulher negligenciasse suas tarefas ou
se ela não as fizesse de acordo com as satisfações do homem, então esse tinha o
direito de castigá-la, até que ela tivesse aprendido o que o dever exigia.
Se ambos gostavam ou não mais, de viver um
com o outro, não vinha ao caso a questão. Por isso o homem devia ter pensado
antes de ter trazido a mulher para dentro de sua casa. Desse momento em diante
eles tinham de viver em comum até que a morte os separasse. Uma separação não
existia, nisso ninguém havia pensado como resolver.
Até então Seabhac nem havia visto ainda a possível moça com a qual talvez
quisesse se ligar para sempre. Quando, naquela noite ele entrou em sua cabana,
encontrou Muirne sentada ao lado do
fogo. Ela cochilava. A cabeça com cabelos brancos estava caída sobre o peito,
os traços do rosto mostravam palidez transparecendo estar quase no momento para
um falecimento iminente. Seabhac
assustou-se. Ele dependia de sua mãe, muito mais ainda, pela comodidade que o
trabalho dela significava para ele. Assim sendo, agora já estava na hora de
pensar em desposar alguém.
Depois se sentou do outro lado do fogo, onde
previamente havia sido colocado para ele um recipiente com um caldo
fortalecedor. Enquanto o tomava, aos rápidos goles, deixou passar diante de
seus olhos interiores, todas as moças que conhecia. Em cada uma delas havia
algo a censurar. Uma era muito gorda, a outra muito magra, aquela tal muito
preguiçosa, aquela outra muito barulhenta e tagarela... Então lhe sobreveio uma
frase que seu pai havia lhe dito outrora: “Quando, algum dia, tu quiseres
desposar, então Brigit cuidará para
que tu encontres uma esposa!”
Ele sorriu. Isto não seria um pensamento tolo, se pedisse para a protetora do fogo e do lar que o auxiliasse a encontrar uma esposa. Então, certamente esta também teria de ser uma esposa na qual o Pai Eterno encontraria sua satisfação. Mal havia pensado nisso, então já começou a chamar suavemente por Brigit. Era como se ele visse a delicada figura ao lado do fogo, ainda que pudesse ser uma ilusão. Pois seriamente ele apresentou o seu pedido, que lhe parecia ser muito importante, por ele o estar levando com sensação de realidade. Ele tinha que ter incondicionalmente uma esposa. Nem podia mais imaginar sua vida futura sem uma companheira. Então, ele ouviu uma amável voz, que lhe falou suavemente: ❝Seabhac, é bom que peças meu conselho. Se todos os homens se deixassem guiar por mim na escolha de suas esposas, haveria então mais casamentos felizes.
Ouça: ainda hoje à noite te será trazido na
cabana aquela que deverá se tornar tua futura esposa. Contudo, acautela-te de
tocá-la antes que tenha chegado o tempo para isso. Coloca-a ainda hoje a noite
para fora de casa e só te aproximes dela quando eu te permitir.❞
A voz silenciou, lá fora bateram fortemente
à porta. Uma lança passou zunindo pelo telhado. Este era o sinal que alguém
queria entrar. Muirne despertou e
ergueu-se tremendo. Seabhac, porém,
havia se apressado até a entrada, antes que uma das servas viesse dos aposentos
dos fundos.
De fora pulou um cavaleiro de seu pequeno
cavalo, esgotado. Ele tinha nos braços uma mulher. Seabhac viu longos cabelos dourados balançarem ao vento. Mais ele
não pôde distinguir, a mulher estava envolta em cobertas. Eram peles preciosas,
a mulher deveria ser nobre e rica.
— “Tu és o chefe desta tribo?” perguntou o
estranho e dispôs-se a entrar com sua carga para dentro da cabana. Lembrando-se
da advertência, Seabhac colocou-se
no caminho.
— “Tu tens razão estranho, eu sou o chefe
daqui. Se tu queres me trazer uma moça para que eu cuide dela, então saiba que
eu não tenho nenhuma esposa para cuidar de minha cabana. Levai-a até a casa
vizinha, onde Sile, minha irmã, mora
com seu marido. Lá ela estará mais bem guardada.”
Sem dizer uma palavra contrária, o cavaleiro
virou-se e dirigiu seus passos para a cabana indicada. Seabhac seguiu-o. Com poucas palavras ele entendeu-se com Sile, a qual lhe prometeu cuidar
amavelmente da moça. De volta, Seabhac
pediu ao cavaleiro para que viesse mais tarde, para que eles pudessem conversar
o necessário pelo acordo.
Muirne estava revoltada, quando o filho entrou novamente na
cabana. Como podia ele dizer que em sua cabana faltava a mulher! Não seria aquela
como mãe ainda melhor? Não teria ela cuidado ainda melhor da estranha do que
qualquer mulher casada e jovem?
— “Deixa que seja assim, mãe” conciliou Seabhac “teria sido muito para ti. Nós
não sabemos se a estranha está doente ou talvez até ferida. Sile é jovem e pode realizar facilmente
o trabalho. Tu podes ajudá-la tanto quanto quiserdes” acrescentou o filho
sorrindo. Ele conhecia a curiosidade de sua velha mãe.
Depois de pouco tempo o cavaleiro de volta
entrava por sua porta. Ele entregou ao chefe um pesado feixe e pediu-lhe para
que o guardasse muito bem. Era o devido dote de Meinin. Mais eles não podiam esperar, pois a suntuosa casa de seu
pai havia sido incendiada. Inimigos haviam atacado a tribo, na qual o pai de Meinin era chefe. Ele, o servo de
confiança da família, havia salvado a moça e a trazido para a escolha de Seabhac. Agora ele queria voltar e ver
se ainda poderia encontrar seu senhor, o qual havia sido aprisionado.
— “Case com Meinin” aconselhou o servo. “Ela é de origem nobre e uma mulher
melhor jamais poderás encontrar.”
O chefe teria gostado de saber ainda mais, mas o
servo tinha pressa. Cada minuto era precioso. Ele rejeitou até o descanso
oferecido e saltou para cima de seu cavalo, saindo noite afora. Muirne, porém, esgueirou-se à cabana de
Sile, cujo marido estava caçando e
procurou ver a moça para, se possível, conversar com ela.
(continua)
Texto da série especial denominada: Escritos
Valiosos
Personagens e fatos processados dentro do
contexto deste episódio:
Seabhac, Habicht: Se trata do personagem de destaque nos acontecimentos,
que se situa como soberano de uma comunidade celta.
Goban: deus ferreiro dos Tuatha Dé Danann; com
Credne e Luchtain formavam o "Trí Dé Dana"; fez as armas que os
Tuatha usaram para derrotar os Fomorianos. Equivalente a Goibniu e Govannon
(galês).
Na
mitologia irlandesa Goibniu ou Goibhniu era um dos filhos de Brigid e Tuireann
e ferreiro dos Tuatha Dé Danann. Ele e seus irmãos Creidhne e Luchtaine
tornaram-se conhecidos como os Trí Dée Dána, "os três deuses de
arte", que forjaram as armas que os Tuatha Dé usaram para combater os
Fomorianos. Suas armas eram sempre letais e seu hidromel concedia
invulnerabilidade a quem o bebesse.
Padraic: É o nome principal do ancião que surge neste episódio
como druida da comunidade celta, sendo, portanto um personagem influente de seu
meio.
Brigit: é a Deusa dos
ferreiros, dos artistas, das artes e da cura. Sendo uma Deusa solar, ela é
padroeira do fogo e de tudo que envolva Inspiração e Artes. É uma Deusa
tríplice, tendo três faces, a poetisa, a médica e a ferreira.