Sobre a vida dos Celtas –XX
Por
Charlotte von Troeltsch e Suzanne Schwartzkoff
Para leitura do episódio anterior: Sobre a Vida dos Celtas XIX
Anteriormente: Pieder determinou o dia da
consagração da casa de Deus, a qual fora realizada de forma digna e cheia de
devoção. Ele implorou a bênção do Pai Eterno para todos que entrassem na casa
com uma crença verdadeira e pediu para que a partir de então a força do Filho
de Deus também fluísse por esse ambiente. Diante do povo inteiro ele abençoou
então o matrimônio do casal de príncipes, o qual passou então a ocupar o novo
palácio...
Cuimin teria gostado ainda de ter se mantido afastado por um
tempo da regência, mas Seabhac
permaneceu firme na decisão de que ele deveria representar agora seu cargo com
toda seriedade. O pai queria então se retrair e viver totalmente para aquilo
que ele imaginava como a coroa de toda a vida: o saber a respeito do Pai
Eterno. Apenas então ele notou que dentre todos com os quais ele havia vivido
quando jovem, ele era o único que ainda havia restado. Ele não tinha ninguém
que o compreendesse totalmente, com quem se ligasse com um pensar análogo.
— “Por que te aborrecer sobre isso?”
perguntou Nuado, que se mostrava a
ele quase que diariamente. “Tu tens, pois, a mim. Eu sempre estarei agora
contigo, pois agora virá o tempo em que eu poderei te acompanhar a outras
planícies.”
Então
Fionn também quis iniciar a missão
de sua vida. Cuidadosamente ele se preparou, sobretudo havia providenciado um
bom navio, pois tinha que atravessar as águas, se quisesse se dirigir rumo ao
norte, para onde seu guia indicava. Ele também o obedecia incondicionalmente,
assim como Brigit fazia em relação à
deusa, e todo conselho de que necessitava, ele recebia dele.
Golin não quis mais se separar do amigo. Ele levara a sério
aquilo que havia dito outrora ao príncipe.
— “Eu também posso construir em outros
países, se for da vontade do Pai Eterno. O principal para mim é que eu auxilie Fionn em sua grande e sagrada obra.”
Como servos e acompanhantes Fionn escolhera só aqueles que se
ofereceram e eram fortes. Doze homens queriam partir com ele, e todos se
alegravam por isso. Pieder abençoou
o grupo na nova casa de Deus e implorou ao Pai Eterno por bênção no trabalho
deles.
— “Se eles tiverem que deixar suas vidas a
teu serviço, Senhor do Céu e da Terra, então permita que eles o façam
alegremente. Dar a vida que eles consagraram a Ti é algo pequeno, mas não
permita que eles se tornem infiéis, nenhum deles, pois isto seria um grande
infortúnio.”
Comovidos, os homens prometeram ser fiéis ao
Pai Eterno e honrar o Seu representante Fionn.
A despedida do filho ao pai fora breve. Seabhac
havia desejado assim. Cuimin
acompanhou o irmão gêmeo ainda até o navio e ficou velando, para que a partida
para fora dos recifes fosse bem sucedida.
Os irmãos sabiam que nessa vida não
voltariam a se ver novamente, mas isso não lhes oprimia os corações. Cada um
possuía uma missão dada pelo Pai Eterno e isto lhes bastava.
O capitão do navio conhecia o mar e levou o
grupo são e salvo a uma costa estranha e íngreme, onde havia muito gelo e neve.
Lá as montanhas eram mais altas e escarpas do que na pátria. Segundo a
orientação do guia luminoso, Fionn
tomou um caminho em direção ao norte. Ali não havia nenhuma localidade, como os
homens estavam habituados. Casas isoladas encontravam-se aqui e acolá entre as
altas montanhas ou à margem dos lagos. Cordialmente os habitantes acolhiam os
estranhos, que se admiravam por isso. Mas um entendimento entre eles não era
possível, pois os idiomas eram muito diferentes. Foi se tornando, contudo, cada
vez mais frio, de modo que o guia de Fionn
indicou que ele e seus homens devessem pedir por estadia em uma localidade
especialmente maior. Ele deveria mostrar o ouro e isto levaria a um
entendimento.
E assim também aconteceu. Eles hospedaram
com prazer os estranhos que podiam pagar pela estadia. Eles, porém, utilizavam
esta estada involuntária a fim de aprender o idioma do país. Incansáveis eram
eles, pois sem isso a missão de Fionn
teria de fracassar.
Alguns meses mais tarde, Fionn entendia tanto da linguagem que, já
tinha até tomado conhecimento de quais deuses as pessoas oravam. Eles
denominavam seu mais elevado Deus de Wuodan.
Sem dificuldades Fionn reconheceu
nele, Nuado, as pessoas apenas não
viam ali nenhuma mão de prata que só trazia bênçãos, mas também lhe atribuíam
toda sorte de coisas ruins. Contudo, pelo menos era uma base sobre a qual se
poderia continuar a erigir. Apesar disso, logo se tornou claro a Fionn que essas não eram as pessoas que
ele havia visto em espírito, as coisas ali estavam bem ordenadas e o saber
deles a respeito das coisas divinas era restrito, mas interior. Tão logo se
tornasse mais quente eles deveriam ir adiante.
Ao longo de anos ele andou com o seu grupo,
primeiramente em direção ao norte, depois mais para o leste. Todas as
dificuldades, muitas vezes bem grandes, se lhes tornava facilmente suportáveis
através do auxílio do guia luminoso. Eles jamais precisaram passar realmente
necessidades, também inimizades permaneceram distantes deles. Quanto mais para
o leste eles iam, tanto mais se modificava o idioma. Cada estação do inverno em
que eles precisavam ficar instalados era utilizada para adquirir novo saber.
E então, um dia, Fionn avistou as primeiras pessoas que correspondiam às imagens que
antes lhe haviam sido mostradas. Eram homens feios, com narizes chatos, lábios
avolumados, olhos estreitos e ossos faciais ressaltados. Por causa do frio eles
estavam totalmente envolvidos em peles, as quais eles jamais tiravam. Estas
tinham que cair do corpo como trapos. Por isso sujeira e mau cheiro eram seus
contínuos acompanhantes. Os homens de Fionn
assustaram-se e quiseram retornar novamente. Quando, porém, seu senhor lhes
indicou que era exatamente estes os homens indicados pelo Pai Eterno, então
eles resolveram ficar e auxiliar com sua parte, para que os “olhos pequenos”, como eles os chamavam,
pudessem aprender costumes melhores. Disto, porém, eles ainda estavam bem
distantes. Com horror, os Celtas viam que os olhos pequenos consumiam a carne dos animais abatidos crua e não
queriam saber nada a respeito de assá-las. Um dia eles até se surpreenderam com
o chefe da tribo, estando este a consumir com prazer um menino falecido
recentemente.
Então, Fionn
teve que empregar todos os esforços para tranquilizar seus homens. Eles
adoeceram de horror; unicamente Fionn
permaneceu firme e intocado.
Penosa fora sua obra junto a essas almas
adormecidas. Demorou muito tempo até que eles compreenderam que ele queria lhes
levar bênçãos. Em geral eles viravam-se indiferentes quando ele lhes falava.
Mas ele não desistia. Com uma paciência incansável lhes auxiliava, também em
coisas exteriores e, aos poucos, eles começaram a ceder. Ele pôde constatar
lentos progressos, até que então, por fim, depois de anos de trabalho duro veio
o dia em que eles se submeteram voluntariamente, e por amor a ele. Eles viam
nele o enviado do Pai Eterno, que agora era o senhor deles. E eles agiam
segundo os seus mandamentos.
Como sinal disso, eles passaram a
denominar-se então, “povo de Fionn” e
a seu país “Terra de Fionn”. Em seu
idioma entreteceram-se partes da língua Celta, que ainda hoje se pode
verificar.
Fionn faleceu muito idoso e todos sentiram sua
morte, todos a quem ele havia transmitido o saber a respeito do Pai Eterno. O
povo de Fionn, porém, segurou-se firmemente naquilo que haviam aprendido e
mantiveram sua crença salva ainda por um longo tempo.
Texto da série especial denominada: Escritos
Valiosos
Personagens e fatos processados dentro do
contexto deste episódio:
Seabhac, Habicht: Se trata do personagem de destaque nos acontecimentos,
que se situa como soberano de uma comunidade celta.
Muirne: velha mãe do príncipe dos celtas Seabhac, Habicht
Meinin: esposa de Seabhac, Habicht que veio de outro reino
salva e aceita para proteção.
Padraic: É o nome principal do ancião que surge neste episódio
como druida da comunidade celta, sendo, portanto um personagem influente de seu
meio.
Donald: Escolhido como novo Superior dos
Druidas (após morte misteriosa d Padraic)
Nuado
Silberhand: No folclore irlandês, era reverenciado como rei e grande líder dos
Tuatha Dé Danann. Possuía uma espada invencível, vindo da cidade de Findias e
que fazia parte dos Tesouros de Dananns. Na primeira Batalha de Magh Turedh
perdeu o braço ou a mão, órgão que foi restituído, mas fez com que ele perdesse
o trono da tribo. Ficou conhecido como "Nuada, Braço de Prata" ou
"Nuada, Mão de Prata". Nuada era o Deus da justiça, cura e
renascimento; irmão de Dagda e Dian Cecht.
Pelo
direcionamento dado a este enredo pelas autoras, este personagem se trata de um
enteal de certa forma
importante em sua ligação com os seres humanos.
Goban: deus ferreiro dos Tuatha Dé Danann; com
Credne e Luchtain formavam o "Trí Dé Dana"; fez as armas que os
Tuatha usaram para derrotar os Fomorianos. Equivalente a Goibniu e Govannon
(galês).
Na
mitologia irlandesa Goibniu ou Goibhniu era um dos filhos de Brigid e Tuireann
e ferreiro dos Tuatha Dé Danann. Ele e seus irmãos Creidhne e Luchtaine
tornaram-se conhecidos como os Trí Dée Dána, "os três deuses de
arte", que forjaram as armas que os Tuatha Dé usaram para combater os
Fomorianos. Suas armas eram sempre letais e seu hidromel concedia
invulnerabilidade a quem o bebesse.
Brigit, é a Deusa dos ferreiros, dos artistas,
das artes e da cura. Sendo uma Deusa solar, ela é padroeira do fogo e de tudo
que envolva Inspiração e Artes. É uma Deusa tríplice, tendo três faces, a
poetisa, a médica e a ferreira.
Lug: ou Lugh - filho de Cian (Kian) dos Tuatha Dé Danann e
Eithne (também Etaine), filha de Balor (rei dos Fomorianos). Comandou as forças
dos Tuatha na vitoriosa Segunda Batalha de Mag Tuireadh (Moytura) contra os
Fomorianos, na qual matou o avô Balor. É a figura extraordinária do Deus jovem
irlandês que suplanta o Deus Velho; está associado à habilidade e à técnica; é
conhecido como Lugh Samhioldanach (de muitas artes) e Lugh Lámhfhada (de mão
comprida). Raiz da palavra gaélica que significa Agosto (Lúnasa), isto é,
Lughnasadh (festa de Lugh). Corresponde ao Lleu Llaw Gyffes galês.
Pieder – príncipe
filho de Seabhac, Habicht e Meinin
Cuimin
– príncipe
filho de Seabhac, Habicht e Meinin
Brigit
– príncesa
filha de Seabhac, Habicht e Meinin
Fionn – príncipe filho de Seabhac, Habicht e Meinin