O Menino e os Gigantes
por Charlotte
Von Troeltsch e Susanne Schwartzkopf
Cumes
de montanhas acidentadas, escarpadas, elevando-se altos contra o céu, pairavam
imóveis sobre um vale na região montanhosa, que se estendia indolentemente
entre as rochas. Neve eterna cobria os cumes, precipícios e fendas,
transformando-se em gelo verde-azulado, invulnerável à claridade ofuscante do
sol.
Num
dos lados do altiplano estavam deitados, recostados nas paredes rochosas, dois
vultos enormes, como se eles próprios fossem parte dessas rochas. Prazerosamente
esticavam-se no calor do sol e olhavam ora para o céu azul escuro, ora deixavam
deslizar seus olhares sobre o movimento da alegre atividade ao seu redor e,
sim, até por cima deles.
Um
rebanho de cabras montanhesas pastava em ambos os lados de um alegre riacho
borbulhante, pastoreado por um menino magro e alto que, sem cessar, tinha que
pular ora para cá, ora para o outro lado, para impedir que animais muito
destemidos se embrenhassem nas escarpas.
No
seu zelo não deu atenção aos dois gigantes até que tropeçasse e caísse na mão
aberta de um deles, estendida no solo aquecido. Este o segurou e o sacudiu
levemente.
“Não
podes prestar atenção ao teu redor, anão?” exclamou ele com uma risada, que
provocou um eco ao redor, como se um trovão retumbasse.
“Me
solta,” gritou o pequeno, defendendo-se com todas as forças. “Me solta, senão a
Fu-Fu cairá lá adiante sobre as rochas.”
“E
isso seria tão grave assim?” quis saber o gigante. Nisso, porém, ele afrouxou
seu punho de modo que o pequeno prisioneiro pudesse escapar.
Como
um raio o menino chegou ao local perigoso ali adiante. Porém, o gigante foi
mais rápido. Erguendo-se um pouco, tinha estendido o comprido braço e segurado
a cabra. Agora estava suspensa sobre a cabeça de seu pequeno pastor, e novamente
a risada do gigante provocou eco na redondeza.
“Ponha
imediatamente a Fu–Fu novamente no chão!” exigiu o menino, que se voltou e veio
correndo ofegante. Porém, o que ele poderia empreender contra o gigante
risonho?
Aí
obteve ajuda inesperada. O segundo gigante despertou de sua sonolência e
imediatamente dirigiu-se categoricamente ao seu companheiro.
“Devolva
a cabra ao menino, ele não merece que tu o atormentes, Uru.”
Imediatamente
este colocou o animal no chão, que correu com altos saltos para junto do seu
pequeno dono.
“Fu-Fu,
malvada,” repreendeu este, abraçando-a quase carinhosamente. “Que imprudente és
sempre!”
E
ele apressou-se para, com a cabra resgatada, juntar-se ao rebanho que pastava
alegremente.
Aí
se lembrou de algo importante. Ele voltou-se, olhou para os dois gigantes que o
observavam e exclamou:
“Agradeço-te,
ó grande!”
“A
quem te referes anão?” perguntou seu alegre atormentador.
“Ambos
somos grandes.”
“Grande
é aquele, que é justo,” foi a resposta inesperada.
O
menino queria retirar-se, quando soou a voz poderosa de seu auxiliador:
“Tu
me agradas. Venha para cá com os teus protegidos agitados e vamos conversar.
Uru só estava brincando. Ele não pode te fazer mal.”
Prontamente
o menino assobiou, reunindo seus animais, bem observando que nas proximidades
dos dois homens gigantes a grama e as ervas cresciam abundantemente.
“O
que chamas de justo?” perguntou o gigante, assim que o pequeno pastor estava
sentado comodamente sobre uma de suas pernas, espreitando ao seu redor.
“Justo
é, quando a gente sabe bem no seu íntimo, o que deve fazer para viver em
equilíbrio com tudo.”
“Isto
eu não entendo,” resmungou Uru, enquanto seu companheiro indagou: “Quem te
disse isso?” “Meu pai.”
“Então
chame o teu pai, para que ele nos esclareça isso,” exigiu o gigante. “Isso eu
não posso. Ele não está mais aqui,” foi a resposta do menino. Foi acompanhada
de um suspiro.
“Com
quem estás vivendo? A quem pertencem os animais?” quis saber o gigante.
“Agora
eles pertencem a Wun, com quem eu também moro. Ele me bate, quando alguma coisa
acontece a uma das cabras.”
“Ele
é o teu avô?”
“Eu
não sei. Mas o sol quer partir, eu tenho que voltar para casa.” Levantou-se
rapidamente, assobiando chamou os seus animais e, numa trilha estreita, correu
com eles morro abaixo.
Uru
levantou-se, seguindo-o com os olhos encosta abaixo.
“Lá
embaixo há alguns montículos de toupeira, lá provavelmente seja a morada do
anão,” observou ele.
“É
uma criança abençoada. Não o vês? Tu não deves fazer mal a ele,” advertiu seu
companheiro.
(continua)
Trecho extraído
do livro: Miang Fong, como relato sobre a vida do grande Portador da Verdade,
que libertou o Tibete das trevas.